quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: Uma Costrução Coletiva

Simone Raquel Pagel Longhi
Karla Lucia Bento
Este artigo discute a importância da construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico na escola como um documento que reflete a realidade escolar, sendo que a escola tem autonomia para elaborá-lo, relacionando-o diretamente à identidade da instituição. Tendo em vista que a escola é constituída de diferentes segmentos, o Projeto Político-Pedagógico cumprirá o seu papel se for uma construção coletiva com o objetivo de melhorar a prática educativa. Procuramos ressaltar que a busca da participação da comunidade escolar é fundamental nesse processo, cujo caminho pode estar cheio de dificuldades, mas que pode, também, ser um momento propício para visualizar novas possibilidades e transformação da realidade.


1 INTRODUÇÃO
Este artigo tem por objetivo refletir sobre a construção do Projeto Político-Pedagógico na escola como um processo coletivo, envolvendo os diversos agentes que fazem parte da realidade escolar.Justificamos a pertinência do tema por compreendermos que a escola possui uma identidade própria, que se constitui sob a influência da sua realidade local e das diretrizes/teorias gerais da educação. Essa identidade nem sempre é explícita ou, mesmo, reconhecida na própria escola, que acaba por reduzir sua função ao repasse de conteúdos prontos e acabados, sem relacioná-los com o público ao qual atende. A construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico é, justamente, uma possibilidade de reconhecimento dessa identidade e de reflexão e mudança da prática pedagógica.
Desenvolvemos a reflexão aqui apresentada com base em levantamento bibliográfico, sendo Veiga (2004), Vasconcelos (2004a e 2004 b) e Padilha (2003) alguns dos autores que fundamentaram as discussões, possibilitando a construção deste texto. Sob a ótica desses autores, o Projeto Político-Pedagógico deve ser um instrumento de diagnóstico e transformação da realidade escolar, construído coletivamente. Além dos teóricos mencionados, a legislação pertinente, tanto no âmbito federal quanto municipal, também subsidiou as reflexões.
A introdução inicia a organização do texto. Na seqüência, procuramos discutir sobre o conceito de Projeto Político- Pedagógico, refletindo sobre seu significado e função e apontando os agentes responsáveis pela sua elaboração. Discutir as ações desses agentes necessárias à efetivação do processo de construção permanente é a proposta seguinte. Apontamos como principais agentes os profissionais da escola, os alunos e os pais. Depois de refletirmos sobre os papéis e formas de participação desses sujeitos na construção coletiva do projeto, procuramos ressaltar a necessidade de mantê-lo como um documento vivo, parte integrante da realidade escolar e, portanto, em constante transformação. Por último, nas considerações finais, retomamos o objetivo inicial do artigo, reafirmando a construção do projeto político-pedagógico como algo necessário e possível.

2 CONCEITO E FUNÇÃO DE UM PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO
Pesquisando o conceito de Projeto Político-Pedagógico, encontramos em Vasconcelos (2004a, p.169) a seguinte explicação:
É o plano global da instituição. Pode ser entendido como a sistematização, nunca definitiva, de um processo de Planejamento Participativo, que se aperfeiçoa e se concretiza na caminhada, que define claramente o tipo de ação educativa que se quer realizar. É um instrumento teórico-metodológico para a intervenção e mudança da realidade. É um elemento de organização e integração da atividade prática da instituição neste processo de transformação.
O Projeto Político-Pedagógico é, portanto, um documento que facilita e organiza as atividades, sendo mediador de decisões, da condução das ações e da análise dos seus resultados e impactos. Ainda se constitui num retrato da memória histórica construída, num registro que permite à escola rever a sua intencionalidade e sua história.
Neste sentido, podemos entender que o projeto norteia o trabalho da escola por encaminhar ações para o futuro com base na sua realidade atual e sua história. É um planejamento que prevê ações a curto, médio e longo prazos, intervindo diretamente na prática pedagógica diária. As ações refletidas no projeto procuram incluir desde os conteúdos, avaliação e funções até as relações que se estabelecem dentro da escola e entre a escola e a comunidade. A ideologia em relação ao tipo de sujeitos que a escola pretende formar dá o tom político ao projeto. Por meio dessa explicitação ideológica e de objetivos articulados com as ações, é possível distinguir entre uma prática que se preocupa com a formação de cidadãos críticos, participativos, responsáveis e sujeitos de sua própria história e outra de repasse e repetição de conteúdo sem estar atenta ao desenvolvimento humano.
A própria metodologia de construção do projeto – centrada em algumas pessoas que detêm o poder de comando da escola ou coletivo de forma que todos se sintam partícipes e responsáveis pelas decisões tomadas – é indício de posição político-ideológica. De acordo com a forma como procuramos conceituar a importância e relevância de um Projeto Político-Pedagógico, não caberia uma construção autoritária e hierárquica. Isso porque compreendemos a escola não como lugar somente de transmissão de conhecimento, e sim como lugar privilegiado para realizar um trabalho pedagógico muito mais amplo visando à formação integral dos cidadãos e buscando o exercício da cidadania por meio da participação e reflexão da realidade da comunidade escolar.
A importância de a escola construir este documento é reconhecida pela legislação. Assim, o Projeto Político-Pedagógico, em âmbito federal, é citado pela Lei de Diretrizes e Bases, Lei 9396/98 (BRASIL,1998), e, no município de Blumenau, SC, é exigência do Conselho Municipal de Educação, Resolução nº 004/00, para todas as escolas públicas e privadas ligadas ao sistema municipal de ensino que atuam na educação básica (BLUMENAU, 2001).
Segundo Sousa e Corrêa (apud DAVIS, 2002, p.49), é preciso pensar “o projeto pedagógico como um direito e um dever da escola e como um dos desafios para o avanço na organização do trabalho pedagógico”.
Para o Projeto Político-Pedagógico realmente ser um direito e um dever, todos os envolvidos nesse processo precisam estar cientes de que fazem parte dele, acreditando na sua importância, para não ser somente um documento, e sim ser utilizado como norteador para um trabalho pedagógico desenvolvido coerentemente entre teoria e prática.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases 9.394/96, a instituição escolar tem autonomia para que o Projeto Político- Pedagógico aconteça. Isto é assegurado no art. 15, Título IV: “Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público.” (BRASIL, 1996)
Em relação à autonomia, é preciso perceber que existem três eixos que estão interligados – administrativo, financeiro e pedagógico – e que delineiam a identidade da escola. Autores que discutem a questão da autonomia reconhecem a limitação da escola em relação a esses eixos, sendo, portanto, uma autonomia relativa. Segundo Veiga (2004, p. 14),
A principal possibilidade de construção do projeto político- pedagógico passa pela relativa autonomia da escola, de sua capacidade de delinear sua própria identidade. Isto significa resgatar a escola como espaço público, lugar de debate, do diálogo, fundado na reflexão coletiva.
Quanto mais ampla for a participação de diferentes agentes no processo de construção do projeto, mais ampla pode se tornar essa autonomia. Segundo Vasconcelos (2004a, p.47), “não compete à equipe diretiva assumir o papel de guardiã do projeto, e em especial do cumprimento da programação. Isto é tarefa de todos”.
Sendo resultado da reflexão coletiva, implica compromisso coletivo que orienta a prática pedagógica da instituição, cria estratégias e condições para um planejamento geral, aponta os ideais dos envolvidos com a questão educacional e a adequação à realidade social. Não é um processo simples, pois exige de seus agentes o compromisso de ressignificar a própria prática. Segundo Gadotti (1994 apud VEIGA, 2004, p. 12),
Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas com o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar uma nova estabilidade em função da promessa que cada projeto contém de estado melhor que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam visíveis os campos de ação possível, comprometendo seus atores e autores.
A exigência legal tem mobilizado escolas, tanto na construção como na atualização do Projeto Político-Pedagógico. Por meio desse movimento de reflexão sobre a própria realidade e retomada periódica do documento, tem-se procurado assegurar seu caráter de intervenção e mudança, não apenas como cumprimento de exigência legal, mas, justamente, como reconhecimento de que a realidade muda e de que a mudança traz novas exigências, novas posturas, diferentes práticas e relações. No município de Blumenau, especificamente, esse movimento pode ser observado por meio das orientações do Conselho Municipal de Educação em relação à construção e reformulação periódica do documento.
A instituição que se propõe seguir com seriedade e compromisso a construção coletiva do Projeto Político- Pedagógico demonstra estar disposta a discutir, a se expor e a reorganizar-se de acordo com a necessidade e possibilidade de seus educandos, familiares e comunidade. Nessa escolha, fica explícito ser indispensável a participação desses agentes: funcionários da escola (administrativo, financeiro, pedagógico), alunos, familiares e comunidade. A articulação e a viabilização do processo participativo desses sujeitos passam pelo reconhecimento da identidade, função e influência de cada um dos agentes na realidade da escola. Esta questão, pela sua importância, é a discussão da próxima parte deste artigo.

3 PARTICIPAÇÃO COLETIVA: QUEM, POR QUE E COMO VIABILIZAR?
3.1 QUEM SÃO OS AGENTES E POR QUE DEVEM PARTICIPAR
3.1.1 A liderança do processo
Como já vínhamos discutindo, na forma como compreendemos o Projeto Político Pedagógico (PPP), ele não pode ser imposto, mas construído coletivamente, por se tratar de um documento que expressa a identidade de uma comunidade (escolar) e não de um grupo ou equipe técnica, sendo uma necessidade, e não apenas uma obrigação.
Essa construção será possível por meio das discussões e reuniões que envolvem toda a comunidade escolar, ou seja, entre equipe administrativa, financeira e pedagógica, alunos, familiares e comunidade, focando sempre a melhoria da prática educativa e transformando idéias e concepções em movimentos de ação importantes e fundamentais para o processo de construção.
Todo processo requer um articulador que, no caso da construção do Projeto Político-Pedagógico, pode ser o(a) diretor(a) da escola, o(a) supervisor(a), o(a) coordenador(a) ou outra liderança expressiva na realidade escolar. Conforme o tamanho da escola – espaço físico e número de funcionários/ alunos – poderá existir uma equipe articuladora. A essa equipe caberá conhecer e refletir sobre as metodologias possíveis de construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico e planejar as formas de participação e sensibilização dos demais sujeitos durante o processo de construção. Por reconhecermos que existem diferentes realidades escolares, optamos por denominar, neste artigo, de articulador ou equipe articuladora a quem assume a liderança desse processo.
A idéia da equipe se pauta, também, na motivação do próprio articular que, se estiver sozinho, poderá se abater por dificuldades possíveis e prováveis que encontrará na caminhada. Sendo parte de uma equipe, sempre há a possibilidade de ajuda mútua, de troca, do estabelecimento de uma rede de apoio da qual devem fazer parte, também, os teóricos que escrevem a respeito do tema. Essa rede de apoio pode, inclusive, estabelecer ligações com outras escolas que já tenham caminhado mais adiante em relação a esse processo, promovendo, assim, troca de experiências entre diferentes realidades.
O papel da equipe de apoio é fundamental na viabilização do processo, pois é dela a função de planejar ações para sensibilizar os envolvidos, buscando conscientizar (e estar consciente e convencida) da importância desse documento para promover melhor qualidade nas práticas da escola e, conseqüentemente, da educação.
3.1.2 Administrativo, financeiro e pedagógico: o envolvimento dos funcionários da escola
A existência de uma escola requer o trabalho de muitas pessoas que interferem diretamente no seu cotidiano. Neste sentido, é preciso envolver todos os seus funcionários – da secretaria, limpeza, cozinha, biblioteca, entre outros – na elaboração do Projeto Político-Pedagógico para que este possa retratar a realidade global da comunidade escolar.
Os funcionários devem ser sensibilizados a participar da elaboração do Projeto Político-Pedagógico, o que poderá acontecer de diversas formas: acreditando que este processo pode melhorar a educação; buscando as questões que influenciam o trabalho desenvolvido na escola; relatando, por meio de questionários e entrevistas, sua prática e o que acreditam ser necessário mudar para ter um ensino de qualidade; e procurando trazer soluções para as questões-problema da escola. A participação dos mais diferentes segmentos faz com que, na sua individualidade, o funcionário da escola perceba a importância da sua função na organização e funcionamento da escola. Esta conscientização terá reflexos na coletividade já que cada um poderá passar a exercer seu papel compreendendo a influência que exerce sobre a função do outro.
Cabe ressaltar a importância de os professores aderirem à elaboração do Projeto Político-Pedagógico e com ele se comprometerem, trazendo para as discussões sua visão de educação e ações possíveis de serem executadas e que possam melhorar a qualidade da educação na escola. Neste sentido professores são agentes essenciais para elaborarem a redação técnica e buscarem o referencial teórico para fundamentar os ideais e opiniões expostos nas reuniões. Esta redação poderá ter o apoio de outros agentes envolvidos na construção, sendo que alguns cuidados para evitar o desânimo e a descrença são muito importantes. Segundo Vasconcelos (2004b, p.44),
Para resgatar a credibilidade dos educadores nos processos de planejamento, é decisivo que possam vivenciar:
• Algo que não demore muito na elaboração; é muito desgastante quando a escola fica anos elaborando seu projeto.
• Algo que efetivamente aconteça, que na Realização Interativa revele a pertinência e a viabilidade de concretização.

Partindo do pressuposto de que professores e demais funcionários da escola tenham um comprometimento profissional e ético em relação à qualidade da educação, a sensibilização, o convencimento destes precede o envolvimento dos alunos e familiares. Tanto os alunos quanto seus familiares precisarão encontrar motivação na equipe de funcionários da escola para acreditarem na importância desta construção. Além dessa motivação, os próprios professores deverão estar convencidos da necessidade dessa participação já que “a escola não pode ser propriedade dos professores, ela deve incluir toda comunidade educativa no planejamento de suas metas de melhoria”. (HERNÁNDEZ, 2003, p.25).
3.1.3 Envolvimento dos alunos, das famílias e da comunidade
Quando o Projeto Político-Pedagógico é elaborado, é necessário conhecer a realidade em que vivem os alunos da escola, a sua história de vida e os seus sonhos para o futuro e refletir sobre eles. Neste sentido, a equipe articuladora precisa buscar alternativas que possam abranger todos os alunos nesta elaboração, observar, dialogar e entender a importância da escola para a vida deles. É relevante lembrarmos que a escola existe em função do aluno e que é ele quem vive mais diretamente o processo pedagógico, a realidade escolar. Conteúdos, avaliação, relações sociais e valores vão constituindo, diariamente, a história de vida de cada criança e, possivelmente, cada criança terá algo a dizer sobre esses assuntos que vivencia.
Durante a elaboração, os alunos devem ser ouvidos para que possa ser entendida a visão que os mesmos têm da escola onde estudam. As formas como as crianças expressam o que pensam são muito diversas das formas que os adultos utilizam. Adultos falam e escrevem, basicamente. Crianças exteriorizam por meio das notas, do empenho, da alegria (ou não) de estarem na sala, da preferência pelo recreio e não pela sala de aula, do número de faltas, da evasão, da reprovação, da violência e da depredação contra pessoas e estrutura física da escola.
Promover a participação dos alunos significa atestar para eles sua importância, bem como mostrar que a escola se preocupa com eles e deseja assumir a responsabilidade de buscar caminhos que possibilitem transformar a realidade em que vivem.
A participação da família nas discussões possibilita à escola compreender e reconhecer mais profundamente a realidade de seus alunos. A escola é uma parceira na educação das crianças, é uma das instâncias responsáveis pela formação humana, não a única. A família é, geralmente, a primeira que estabelece uma relação entre a criança e o mundo. Concepções, valores, comportamentos que a criança desenvolve estão relacionados com essa experiência ou com a falta dela. Ouvir os pais significa abrir a escola para quem, mesmo não estando presente diretamente na escola, está envolvido com ela, tendo interesse em tudo o que ocorre nos tempos e espaços da instituição.
A contribuição dos pais pode não ter base teórica, mas, certamente, trará angústias, desejos e medos que eles sentem em relação à vida escolar de seus filhos. Trará sentimentos que, se até aquele momento não influenciavam diretamente a organização da escola por não estarem nela envolvidos, exerciam influência sobre a motivação com que mandavam as crianças para a escola e as matriculavam. Além desse aspecto, é possível que os pais ressignifiquem o olhar que a escola, principalmente por meio do professor, possui em relação à prática pedagógica e à organização. O olhar que vem de fora proporciona a observação de pontos que já se acomodaram aos olhos daquele que convive diariamente naquele espaço.
Pelos motivos expostos é que, no processo de construção do Projeto Político-Pedagógico, é muito importante a escola conhecer a realidade que a cerca: que tipo de comércio existe, qual a cultura de sua comunidade, que tipo de atividades acontece nas proximidades e de que forma são utilizados os tempos e espaços existentes fora dos portões da escola. Nesse sentido, a equipe articuladora deve afirmar a escola como um espaço comunitário. Estudar esse espaço mais amplo significa buscar compreender que expectativas a comunidade em geral têm em relação à escola e reconhecer que os agentes dessa comunidade podem contribuir para melhorar a prática educacional ali existente.
Finalizando a discussão relacionada à necessidade da elaboração e participação coletiva, Vasconcelos (2004a, p.41) ainda esclarece que, “Não havendo adesão do coletivo, um projeto pode ser elaborado pela equipe de direção, tanto para cumprir uma exigência, quanto para ter alguns elementos de referência para o próprio trabalho, mas entendendo que não é o da escola como um todo.”

3.2 A VIABILIZAÇÃO DO PROCESSO: ALGUMAS POSSIBILIDADES
Por mais significativa que seja a função do Projeto Político- Pedagógico, a sua viabilização não é um caminho fácil. Chegar a um consenso não é fácil, pois são muitas idéias e concepções. A equipe articuladora deve estar atenta a essas discussões, refletir sobre cada item com o grupo e pesquisar junto com a equipe redatora a fundamentação para esclarecer as dúvidas aos agentes envolvidos. Neste sentido, Vasconcelos (2004a, p. 30) lembra:
A apreensão que os diferentes membros da comunidade educativa farão da realidade escolar poderá ser bastante divergente. Vai ser preciso muita interação, muito diálogo para se chegar às necessidades e às possibilidades de forma rigorosa (não-alienada) e coletiva.
Para tornar possível a realização do Projeto Político-Pedagógico, é preciso, de acordo com Padilha (2003), pensar em estratégias, em uma metodologia de trabalho que reconheça esse momento como uma festa da escola cidadã, ou seja, como um momento que permite uma leitura de mundo no sentido de conhecer a realidade local e intervir de forma democrática e participativa. Para efetivação desse processo, Padilha (2003, p.25) sugere os seguintes passos:
1. Discutir com a comunidade escolar o significado dessa festa.
2. Constituir uma comissão que organize e coordene esse processo na escola, em sintonia com os outros colegiados escolares.
3. Criar espaços para que toda a comunidade escolar possa decidir sobre como será a festa em todas as suas dimensões.
4. Definir responsabilidades, atribuições, cronograma das ações e oferecer formação aos membros da Comissão da Festa para melhor qualificar a sua atuação na mesma.
5. Socializar a experiência na própria escola com outras escolas e ampliar essa troca em relação ao nível interescolar, municipal, etc.
6. Ampliar a comunicação na escola e dar retorno permanente à comunidade escolar sobre o resultado dos trabalhos e das atividades desenvolvidos, inserindo-a na avaliação dialógica desse processo.
7. Analisar e interpretar permanentemente os resultados parciais da leitura do mundo, especialmente nas suas dimensões social, política, ambiental, econômica, enfim, cultural, realizando a transposição do resultado desse trabalho para o marco referencial do PPP da escola, no qual se registram a visão de mundo da comunidade escolar, suas utopias e seus sonhos de uma escola melhor.
8. Atualizar o direcionamento do olhar em relação a determinados enfoques e dimensões que se deseja pesquisar e/ou aprofundar, tornando a festa um evento permanentemente atualizado em suas linguagens e atividades.

Além dos passos mencionados, existem outras formas de conduzir e construir o Projeto Político-Pedagógico da escola. Cada instituição tem autonomia para escolher a maneira mais adequada à sua realidade e que viabilize a construção do mesmo. Porém, ressaltamos que a leitura de mundo que Padilha (2003) menciona é fundamental para a construção do Projeto Político- Pedagógico, pois, assim, a escola estará definindo a sua política educacional por meio de metas e objetivos importantes para aquele momento e local, ou seja, por meio da leitura de mundo, é possível articular as necessidades e as possibilidades que estarão presentes nas discussões, sem tomar o caminho do impossível. Para que essas discussões aconteçam, é essencial sensibilizar os agentes envolvidos no processo sobre a importância que essa leitura de mundo terá na história da escola.
De acordo com Vasconcelos (2004a), depois de formada uma equipe articuladora, a primeira ação a ser desencadeada junto aos sujeitos que participarão da elaboração do Projeto Político- Pedagógico é a sensibilização dos mesmos de forma a reconhecerem a relevância do processo do qual participarão: “O período que precede a elaboração pede muita dedicação e cuidado, um verdadeiro trabalho de sensibilização para a necessidade de se fazer o Projeto e, em particular, ao momento da decisão de se fazer (e de como fazer)”. (VASCONCELOS, 2004a, p. 38).
A equipe articuladora deve estar atenta a essa etapa para sensibilizar o grupo sobre a importância de todos os seus integrantes participarem e serem co-autores do projeto. Essa sensibilização deve ser pensada de forma que possa atingir a todos, comprometendo-os na elaboração do Projeto Político- Pedagógico. Ela poderá ocorrer por meio de discussões com o grupo e conversas sobre o que esses agentes sonham para o futuro e o que pensam ser fundamental para viverem felizes.
Essa etapa exige sensibilidade da equipe articuladora para poder elaborar uma metodologia com músicas, desenhos, textos e histórias, explorando diferentes linguagens de forma a atingir diferentes pessoas. Deve estar presente a fundamentação teórica, legal e poética, que compreende o Projeto Político-Pedagógico como um retrato sempre inacabado da vida da escola. Não pode haver imposições ou autoritarismo, e sim sedução. A realidade da escola e as cobranças constantes em relação às pessoas que dela fazem parte são duras e desanimadoras. A construção do projeto não deve se pautar na concepção de que é mais um trabalho a ser executado. Trabalhar com as resistências que podem surgir nessa etapa é o grande desafio da equipe articuladora, pois:
 diante das dificuldades (desânimo, descrença, pouco envolvimento) se coloca uma questão fundamental para a equipe que está coordenando o processo de planejamento: não entrar no jogo de acusação ao professor (‘são resistentes, não querem nada, são autoritários e conservadores, não querem mudar’) (VASCONCELOS, 2004a, p. 38).
Quando a construção do Projeto Político-Pedagógico começa sem a preocupação com a sensibilização dos envolvidos, muitos são os que acabam desistindo de participar por não entenderem a proposta ou, simplesmente, não se verem como parte importante na construção.
Esse período de sensibilização e as linguagens que vão sendo utilizadas duram até o momento em que o grupo decidir se construirá o Projeto Político-Pedagógico coletivamente ou não. Uma vez concordando com o processo, não há mais necessidade dessa etapa em virtude de todos os envolvidos já terem se comprometido com a sua construção. Este é o momento de decidir, coletivamente, quem serão os agentes e a forma de participação dos mesmos.
Segundo Vasconcelos (2004a, p.176), “o Projeto deve ser iniciado quando houver por parte da instituição o desejo, a vontade política, de aumentar o nível de participação da comunidade educativa, o real compromisso com uma educação democrática”. Iniciada a elaboração, é preciso estar atento às reais necessidades que a escola possui e o que é possível ser feito do Projeto Político-Pedagógico. Articular as discussões para reconhecer o que é necessário e possível de realizar dentro da especificidade daquela escola é o grande desafio da equipe nessa fase. Diagnosticar o real e planejar o ideal é o desafio de um projeto político-pedagógico. Porém, não podemos pensar em um ideal impossível de ser alcançado sob pena de não haver credibilidade por parte dos agentes em relação ao documento que está sendo construído.
Atualmente, vivemos num corre-corre diário e, muitas vezes, os encontros presenciais com todos os integrantes na construção do Projeto Político-Pedagógico não são possíveis. Para viabilizar a participação de tantos agentes diferentes, a equipe articuladora poderá utilizar-se de diferentes recursos. Logicamente que assembléias gerais, com a participação de um número expressivo de participantes enriquecem o debate, porém não se deve inviabilizar o projeto tendo em vista a impossibilidade de reunir todos. Ressaltando mais uma vez a questão da motivação, o primeiro ponto é a equipe festejar os presentes e não lamentar os ausentes. O segundo ponto é encontrar meios de fazer com que essa participação ocorra com mais agentes.
O mundo virtual nos permite encontros por meio da rede de computadores, sendo um grande aliado para reuniões e debates. Porém, é sabido que não está ao alcance e na realidade da boa parte das escolas e, muito menos, das famílias. Ainda assim, é uma forma a ser pensada para algumas realidades mais privilegiadas. Para aquelas cujo recurso da informática é escasso ou mesmo inexistente, há de se pensar em outros meios. No momento da matrícula, por exemplo, pode ser entregue um questionário às famílias para que respondam e devolvam no primeiro dia de aula. Conforme a realidade, pode ser possível marcar uma entrevista pessoal com cada pai/mãe/responsável e ser aplicada pelo próprio professor de forma semi-estruturada, ou seja, sempre com abertura para discussões de assuntos que não foram previstos pela equipe articuladora. As visitas domiciliares também podem trazer informações importantes em relação à realidade das famílias.
Outra forma de se aproximar da realidade do aluno é desenvolver um projeto que busque retratar a identidade socioeconômica-cultural de cada criança na própria sala de aula. O professor pode pedir informações aos alunos por meio de diferentes recursos: fazendo com que as crianças se tornem entrevistadoras da própria família, pedindo documentos como registros, carteiras de vacinação, fotografias, desenhos que as crianças podem fazer para retratar a sua realidade, os seus desejos e sonhos em relação à vida e em relação à escola.
As crianças podem ser agentes também na identificação da comunidade externa à escola, caso a equipe articuladora e os demais agentes não possam fazer esse levantamento ou considerem relevante para a formação humana do aluno o reconhecimento da própria realidade. Vale ressaltar, mais uma vez, que a riqueza de uma assembléia presencial é praticamente insubstituível. Porém, a impossibilidade da realização com freqüência desse recurso não pode servir de desculpa para a não-realização do projeto.

4 AVALIAÇÃO E RETOMADA: AÇÕES NECESSÁRIAS À MANUTENÇÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO
A avaliação é importante em todas as etapas de construção do Projeto Político-Pedagógico, pois, por meio da análise de onde estamos e aonde queremos chegar, não nos desviaremos o foco de nosso objetivo.
Quando termina a escrita do Projeto Político-Pedagógico, é preciso analisar o que conseguimos fazer e os encaminhamentos que merecem atenção depois do projeto construído. Existirão metas a curto, médio e longo prazos e providências a serem tomadas em relação a elas. O Projeto Político-Pedagógico é um documento que reflete a escola e sua realidade, sendo que, com o tempo e as mudanças que acontecem na sociedade, é fundamental retomarmos as discussões sobre os objetivos e metas, para que ele reflita a escola como ela é, buscando melhoria na educação. Segundo Vasconcelos (2004a, p. 48), “avaliação mais geral e sistemática da escola (normalmente feita uma vez por ano) deve ser articulada com outras, mas de processo, sendo importante a criação de dispositivos simples e exeqüíveis para tal”.De acordo com a orientação do Conselho Municipal de
Blumenau, presente no Ofício Circular nº 06/04, o período para reavaliação e continuidade da escrita do Projeto Político- Pedagógico para as escolas ligadas ao sistema municipal de ensino em Blumenau deve ocorrer a cada 2 anos.
Independente dessa avaliação mais global e geral que promove a reestruturação dos documentos, o Projeto Político- Pedagógico deve estar sempre sendo utilizado e consultado. Além disso, quando necessário, é importante fazer anotações nele para facilitar a sua avaliação e reelaboração, tendo como base novas práticas e anotações do que foi possível e o que foi adaptado. Algumas ocasiões são muito propícias a essas anotações, como reuniões, assembléias de pais, alunos, professores e comunidade, após participação de algum dos agentes em palestras/congressos/ seminários, entre outras oportunidades que impulsionam ressignificação da prática. Essas anotações devem ser discutidas e socializadas entre os agentes envolvidos no processo. Mais uma vez, lembramos que, além de reuniões presenciais, existem outras formas de avaliar e rever o Projeto Político-Pedagógico, como, por exemplo, questionários, pesquisas e visitas domiciliares.
É importante ter sempre em mente que “o projeto não pode ser uma camisa de força para a escola e para o professor [...] A postura de abertura deve ser mantida” (Vasconcelos, 2004a, p. 47), e que, portanto, não há como ficar preso a prazos estabelecidos para nortear uma prática. Assim, a escola poderá continuar tendo autonomia para reescrevê-lo quando sentir necessidade de modificá-lo ou perceber, durante a prática e execução do mesmo, que há necessidade de redimensionar metas, prazos ou, mesmo, estabelecer novos rumos.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O artigo teve como objetivo refletir sobre a importância e função do Projeto Político-Pedagógico na escola, o qual constitui a identidade da instituição escolar, que se revela nas ações dos diferentes agentes internos e externos que, por sua vez, influenciam tempos, espaços, relações e conhecimentos dessa escola.
Da forma como procuramos discutir o Projeto Político- Pedagógico neste artigo, fica evidente que este possui a função de romper o isolamento dos diferentes segmentos da escola, buscando pela participação coletiva e efetiva de alunos, pais, funcionários e comunidade, não só na sua elaboração, mas, constantemente, na observação crítica do cotidiano escolar. Nesse sentido, possibilita resgatar a escola como espaço democrático, comunitário e público, onde todos tenham voz e vez.
Por meio da reflexão feita, percebemos que a construção do Projeto Político-Pedagógico não é uma ação simples. Implica diversos enfrentamentos pessoais e coletivos, sendo fundamental para o sucesso do processo uma equipe articuladora forte e embasada teoricamente, mas que não se considere detentora/dona do saber. Percebemos, ainda, que é uma construção necessária e possível, devendo ser pautada em dois princípios: o da necessidade e o da possibilidade.
6 REFERÊNCIAS
BLUMENAU (município). Resolução nº 004/00, 17 de outubro de 2000. Estabelece diretrizes para a elaboração do Projeto Político- Pedagógico das Unidades de Ensino pertencentes ao Sistema Municipal de Ensino.L e g i s l a ç ã o, Conselho Municipal de Educação, Blumenau, dez. 2001. p. 34.
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: < http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 25 out. 2005.
DAVIS, Cláudia. et al.Gestão da Escola: desafios a enfrentar. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
HERNÁNDEZ, Fernando. O Projeto Político-Pedagógico vinculado à melhoria das escolas.Pátio, Porto Alegre: Artmed, n.25, p. 08-11, fev. 2003.
PADILHA, Paulo Roberto. Caminho para uma escola cidadã mais bela prazerosa e aprendente.Pátio, Porto Alegre: Artmed, n.25, p. 12-15, fev. 2003.
VASCONCELOS, Celso do Santos. Coordenação do trabalho pedagógico: do projeto político-pedagógico ao cotidiano da sala de aula. São Paulo: Libertad, 2004a.
______.Planejamento: projeto de ensino-aprendizagem e projeto político-pedagógico – elementos metodológicos para elaboração e realização. 7. ed. São Paulo: Libertad, 2004b.
VEIGA, Ilma Passos A. (Org).Projeto político-pedagógico: uma construção possível. 17. ed. Campinas: Papirus, 2004.

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